Extraídos do livro «Monografia de
S. João da Madeira» aqui deixamos alguns excertos que traduzem bem
a história e o vertiginoso progresso daquela laboriosa vila do
nosso distrito.
HISTÓRIA
Introdução
Ao traçarmos o esquisso histórico
de S. João da Madeira, não nos furtamos à confissão sincera do seu
pequeno valor como núcleo populacional no passado, terra de origem
bem antiga, é certo, como o revelam testemunhos coevos do período
genético do reino de Portugal, mas com um período de latência, na
sua evolução, tão grande, que se arrasta obscura e como que em
estado fetal, durante nove séculos ou mais da sua existência. Como
pequena povoação, este núcleo de habitantes viveu esquecido no seu
estatismo até meados do século XIX, momento em que despertou do
seu sono letárgico, quantas vezes milenário, e, mercê dum intenso
e progressivo impulso da sua indústria, do seu comércio e da sua
agricultura, em breve ocupou lugar primacial entre as demais
terras do distrito de Aveiro.
É só, porém, ao iniciar-se o
segundo quartel do século XX, que consegue foros de vila, e,
finalmente, a emancipação concelhia.
Frisemos pois, que, o concelho de
S. João da Madeira, como entidade histórica, pode considerar-se
ainda no período embrionário da sua curva de evolução.
E isto não tem a menor mancha de
desmerecimento, antes pelo contrário, constitui a melhor prova de
que as energias vitais por tão largo tempo acumuladas
representarão a potência dinâmica e impulsiva que hão-de polarizar
e orientar o seu Progresso.
Dadas as circunstâncias, felizes
ainda que fortuitas, deste período de germinação coincidir com uma
fase avançada do desenvolvimento da civilização, do sistema
histórico da humanidade, poderemos aquilatar bem o nível a que se
alçapremará, num futuro mais ou menos vizinho, o desenvolvimento
da Nossa Terra, como centro de actividades humanas de excepcional
importância e grande relevo.
A sucederem-se desta forma, num
ritmo tão célere, os melhoramentos da sua textura, não seremos
demasiado profetas, se antevermos para tempos que não estão longe,
um período de raro e intenso apogeu para S. João da Madeira –
ante-cidade de S. João da Madeira.
Primeiros documentos
A longínquos tempos remontam as
origens de S. João da Madeira. Situada em Terras de Santa Maria,
designação geográfica extensa abrangendo o território conquistado
aos Mouros por antigos fidalgos e cavaleiros da Idade Média,
compreendido entre os rios Douro e Caima, o oceano Atlântico e o
rio Arda, o concelho de S. João da Madeira enfileira ao lado de
povoações circunvizinhas, todas elas com um longo passado
histórico.
Assim, Oliveira de Azeméis, a vila
de Cucujães e a vila da Feira são terras onde se encontram, numa
rica continuidade cronológica, as marcas indeléveis da dominação
celta, romana, árabe e visigoda; em todas é notória uma origem
mais de dez vezes centenária, perdendo-se a sua génese nos
meandros recônditos da brumosa e obscura Idade Média.
E S. João da Madeira, o seu
próprio topónimo já indica claramente, bem assim certas
designações dalguns dos seus lugares, como Mourisca, Casaldelo
(citado nos mais antigos pergaminhos com o nome de Casal de Ero;
este nome Ero ou Hero é o de uma figura importante entre os
godos), etc., é também terra muito antiga.
É em 1088, da nossa era, que
aparece pela primeira vez em manuscritos a menção de S. João da
Madeira.
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Este pergaminho faz parte duma
série de documentas, dois dos quais publicados nos Diplomata et
Chartae (1), outros em via de
publicação na importante revista que se publica na capital do
distrito, Arquivo do Distrito de Aveiro, por intermédio do
Rev. Dr. Serafim Leite, ilustríssimo filho de S. João da Madeira e
uma das figuras de historiador mais proeminentes, entre a plêiade
actual dos investigadores históricos.
O Regional,
publicação quinzenal de S. João da Madeira, inseriu também, numa
série de artigos, preciosa revisão e sistematização desses
documentos, da autoria do Rev. Dr. Serafim Leite
(2).
Ainda que de modesta importância
pela pequena monta do seu valor representativo, esses pergaminhos
permitem-nos seguir, através de citações de simples contratos de
compra e venda de propriedades, de doações de abades, reconstituir
mais ou menos fielmente a situação primitiva de S. João da
Madeira, em paralelo com a actual, os seus usos e costumes, em
suma, uma visão global da vida dos nossos antepassados.
A nossa terra é, pela primeira
vez, citada como «vila de S. João que dizem de Mateira»
(sic).
Sobre o significado da palavra
vila é preciso aclarar bem.
Não tem o significado que lhe é
atribuído nos nossos dias, pois que é sinónimo apenas de povoação
de desenvolvimento variável, compreendendo um maior ou menor
número de propriedades rústicas, em redor duma igreja ou dum
mosteiro e formando uma unidade tributária.
De resto, só mil anos e pouco mais
tarde é que S. João da Madeira conseguiu foros de vila, no ano de
1924.
O Dr. Serafim Leite, no estudo
citado, faz uma rigorosa sistematização desses documentos,
estabelecendo, pela natureza e cronologia deles, uma classificação
em quatro séries.
A Primeira série, desde
1088 a 1109, compreende três contratos de aquisição de
propriedades, dois dos quais, como acima dissemos, publicados na
seu original em Diplomata et Chartae
(3). Em todos eles são compradores Truilo e sua mulher
Donadeo Alvares, que compram aos herdeiros dum terceiro
personagem – Godino Vimaraz –, umas parcelas de terreno que
se situam na «vila» de S. João que dizem de Mateira, em baixo do
Monte Parada Joaz; estendem-se estas propriedades para os
lados do rio UI ou Vila Chã.
No primeiro deles, no ano de 1088,
faz-se referência à igreja, o que vem trazer garantia segura da
existência de S. João da Madeira, como entidade histórica, já
antes da fundação da monarquia, por conseguinte nos tempos de D.
Afonso VI, avô de D. Afonso Henriques, que reinou em Leão, de 1072
a 1109.
A segunda série de documentos,
de 1109 a 1143, também compreende nova colecção de títulos de
compra, compras efectuadas por Gundiçalvo Menedes (Gonçalo
Mendes) e sua mulher, e mercê das quais se tornam senhores da
terra, com direito a apresentar o pároco.
As herdades ficam situadas em
torno da igreja de S. João e estendem-se até Vila Chã, Fundões,
Faria, Casaldêlo, Mamôa
(4), etc.,
lugares que na maior parte constituem ainda, nos nossos dias, os
seus limites.
A extensão da vila de S. João da
Madeira, já no início do século XII, que corresponde à época de
fundação do reino de Portugal, era a mesma ou ligeiramente
superior à actual.
De interesse, ainda, cita-se
nesses documentos a existência duma estrada romana e de outra
mourisca. A primeira não é senão a via romana de Aeminium a
Cale.
É curioso, também, o documento que
constitui a carta de criação e doação do Couto de Cucujães,
assinada por D. Afonso Henriques, ainda então infante. Empenhado
na luta contra os mouros, na sua suprema ânsia de perene expansão
do condado Portucalense, foi obrigado a pedir auxílio às ordens
religiosas que nessa altura existiam.
Assim é que, em paga do prestimoso
auxílio dos frades beneditinos do Mosteiro de Cucujães, o infante
D. Afonso Henriques delimitou uma área em redor desse Mosteiro e
fez aos monges a sua doação (7 de Julho de 1131).
Quando procede à marcação
territorial, é citado o nome de S. João: «...et quomodo dividit
Faria cum Sancto Johane et quomodo separa Casal de Ero cum Sancto
Johane», – ...e deste modo divide Faria com S. João e da
mesma forma separa Casaldelo de S. João
(5).
Do final do século XII, é ainda um
outro documento que diz respeito à separação das rendas da Mesa
Episcopal e Capitular, feita pelo bispo D. Martinho Pires, em
1185, no reinado de D. Sancho, e aquando da sua instituição
dalgumas dignidades da Sé do Porto.
A Igreja de S. João da Madeira foi
nessa altura tributada para a Mesa Episcopal.
A nossa terra é mencionada ainda
nas «Inquirições», do ano de 1251
(6)
no tempo de D. Afonso III, que reinou de 1245 a 1279, para
provarem a existência do foral velho sem data, que à Terra da
Feira deu o rei D. Sancho I, nos fins do século XII.
A passagem é esta, no seu
primitivo latim bárbaro:
«Et si in ypsa vila sancti
Johanys homo mortuus fuerit qui non habent cabalum nec arma debet
dare luitosam domino Regi», o que quer dizer que, «se na
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mesma vila de S. João morrer homem que não tenha cavalo nem
armas pagará lutuosa ao Rei».
Numa terceira série, desde
1179 a 1256, o Dr. Serafim Leite agrupa os documentos que dizem
respeito à doação que fez a esposa de Gundiçalvo Menendes,
de todos os seus bens ao Mosteiro de Rio Tinto. Em nome
dela própria, Gontina Guterre, e de seus filhos, faz com efeito,
em Fevereiro de 1179, doação da igreja de S. João da Madeira, bem
como da de S. Martinho de Fajões, conjuntamente com as terras
circundantes ao Mosteiro e religiosas de S. Cristóvão de Rio
Tinto.
Acerca da causa determinante de
semelhante doação, admite o Dr. Serafim Leite a seguinte
explicação.
É que, como refere Pinho Leal, no
seu livro «Portugal Antigo e Moderno», a abadessa do citado
mosteiro de Rio Tinto, era, em 1141, D. Hermezinda Guterres.
A correspondência possível da data
e de parecença dos apelidos faz sugerir, efectivamente, a
existência dum certo parentesco entre Gontina Guterre e D.
Hermezinda Guterres.
E daí a doação.
Seguem-se ainda, por esta altura,
outros actos de compra de propriedades rústicas agora feitas pela
Mosteiro.
Nas Inquirições de D. Diniz
(7), mais tarde, no século XIII, em 1288,
faz-se menção de 2 «quintãs», ambas existentes em S. João da
Madeira, uma de Estevão Soares e outra de Pêro Viegas.
As mesmas Inquirições de D. Diniz
referem de igual modo que na povoação de Esmoriz existia uma
quintã de Afonso Martins Madeira.
E já agora, damos aqui a
informação, ainda que sob todas as reservas, que alguns autores,
entre os quais Pinho Leal, admitem ser Madeira um apelido
muito antigo e nobre em Portugal, e que tem sido tomado do nome da
nossa terra.
Assim, o autor citado dá conta que
Bluteau afirma que quem utilizou pela primeira vez este
apelido foi João Martins Madeira, aquele que foi alcaide-mor de
Faro, e que tinha o seu solar na nossa terra.
Ainda no mesmo reinado, agora em
1311, devido à extinção da ordem dos Templários, a igreja de S.
João da Madeira passou a pertencer ao Padroado da Ordem Militar
de Cristo.
Em 1320, a mesma igreja é taxada
em 80 libras (8) para subsidiar a guerra
contra os mouros.
Nesta data, sendo Papa João XXII
este concedeu a EI-rei D. Diniz, por tempo de três anos, para
ajudar essa cruzada, a décima das rendas eclesiásticas dos seus
reinos.
*
Pode-se concluir que, por estas
alturas, se começa a concretizar a nossa existência como
agrupamento populacional, mais ou menos autónomo, já com uma certa
importância, ainda que comparativamente de reduzida monta no que
diz respeito ao seu território e à quantidade de seus habitantes,
porém, duma importância grande pela sua privilegiada posição em
relação às vias de comunicação, feliz ocorrência esta que mais
tarde há-de ter o seu eficaz contributo no decisivo progresso de
S. João da Madeira.
*
Numa quarta e última série de
documentos (1256-1598) agrupam-se as nomeações de abades de S.
João, feitas pela abadessa do Mosteiro de Rio Tinto, e a seguir
confirmadas pelo Bispo do Porto.
Em 1385 as monjas do mosteiro de
Rio Tinto passaram para o Mosteiro da Ave-Maria, do Porto, sendo
agora, por conseguinte, beneditinas.
Desde essa altura, as nomeações
começaram a fazer-se, pois, por privilégio do Mosteiro da
Ave-Maria, alternando-se com nomeações do Bispo do Porto.
*
Sem dúvida alguma, através desta
pequena incursão no passado, já tão longínquo, se confirma
suficientemente a antiguidade da povoação e freguesia de S. João
da Madeira. Porém, não se notam foros de grandeza nem de
magnificência histórica.
Uma modesta povoação, freguesia
com a sua ermida velhinha, uma população e um valor agrícola
também modestos, tal é a única realidade sobre a importância de S.
João da Madeira, no passado.
Contudo, não se torna necessária
essa magnificência e grandeza de pergaminhos, que talvez
perniciosamente nos conduziria a uma contemplação estática,
perpétua e estagnadora, dos esplendores duma história
brilhantíssima.
Outrossim, diz vigorosamente o
Rev. Dr. Serafim Leite, espírito cintilante e figura inconfundível
de trabalhador impulsivo e dinâmico, referindo-se algures à sua e
nossa terra:
«Bastam-lhe o espírito de
iniciativa e os braços de que dispõe para alcançar pergaminhos
verdadeiros».
Logo a seguir: «E sempre foi
mais honroso conquistá-los do que herdá-los».
DESENVOLVIMENTO DE S. JOÃO DA MADEIRA
Por alturas de 1820 a 1830,
inicia-se um movimento intenso e persistente no desenvolvimento da
freguesia de S. João da Madeira.
Como que adormecida em longa
hipnose, desperta a pouco e pouco viçosa e deslumbrante, mercê do
/ 15 /
desenvolvimento do comércio, mas sobretudo da indústria, que vai
abrir novos fulgores na sua evolução e progresso.
Num ápice, de pequena povoação que
era ainda nos primeiros decénios do século XIX, transformou-se em
bonita e aprazível terra, uma das primeiras freguesias do distrito
de Aveiro.
O incremento da indústria dos
chapéus, o desenvolvimento concomitante da indústria de
lacticínios, sobretudo da manteiga, a intensificação da vida
agrícola, o extraordinário avanço do comércio, consistindo na
exportação de gado bovino, géneros agrícolas, madeira, etc., tudo
concorre para determinar o rápido e intenso ritmo de progresso de
S. João da Madeira, na segunda metade do século XIX.
A prosperidade fácil da indústria
de chapelaria, que atingiu na nossa terra um grau de
desenvolvimento insólito, primacial foi na importância que teve
germinando e tornando altamente construtiva uma verdadeira escola
de trabalho, que sempre regeu os destinos futuros da nossa terra.
O espírito empreendedor, um
arreigado amor ao trabalho, a energia e potência vitais de seus
homens, criaram em toda a população um clima de confiança nos
próprios valores, um certo grau de orgulho que traçou e delineou
seguramente a trajectória do seu futuro prometedor.
Como dissemos, os primeiros
prenúncios do desenvolvimento em larga escala de S. João da
Madeira manifestaram-se com a criação da indústria de chapéus.
Não se sabe ao certo quais foram
as primeiras terras de Portugal que se ocuparam com o fabrico de
chapéus; todavia, tudo nos leva a crer que S. João da Madeira
tenha sido uma delas, em face do notável incremento que aquela
indústria tem actualmente neste concelho.
Através de documentos históricos,
sabemos que a fábrica mais antiga de que há memória é a que data
de 1802, pertencente a J. Gomes de Pinho, mas pode dizer-se
que já nos meados do século XVIII se fabricavam chapéus de lã
(Citação dos «Anais do Município de Oliveira de Azeméis», 1909.
Em 1858, segunda iniciativa com a
fundação de nova fábrica, que mais tarde veio a pertencer a
José António da Costa.
Quatro anos após fundou-se outra
fábrica de chapéus de lã, pertencente a Francisco Dias de Pinho
(9).
E, assim por diante, começou em
plena laboração uma dúzia de fábricas, tendo por matéria-prima a
lã, até que, graças a António J. de Oliveira Júnior,
criou-se a primeira fábrica de chapéus tendo por matéria-prima o
pêlo de coelho; a esta se seguiram outras.
Nos nossos dias, a indústria de
chapelaria em S. João da Madeira tem no seu efectivo cerca de 10
fábricas, sem contar com os pequenos acabadores que compram nas
fábricas os carapuços para depois os acabar e vender.
Teremos ocasião de examinar
posteriormente, com maior minúcia, a importância e o valor de S.
João da Madeira, o primeiro centro nacional produtor de chapéus de
feltro, aproximadamente dois terços da produção nacional.
Também a indústria de lacticínios
concorreu enormemente para o extraordinário desenvolvimento de S.
João da Madeira, na segunda metade do século XIX.
Basta lembrar uma citação de Pinho
Leal, no seu Portugal Antigo e Moderno: «Por alturas de
1870, os maiores negociantes de manteiga eram de S. João de
Madeira».
*
Muitos varões natos nesta
freguesia tiveram grande projecção na vida portuguesa, no decorrer
dos séculos XVIII e XIX, traduzindo este facto a proeminência da
família sanjoanense.
– Citamos, entre muitos, o Dr.
Bento Cardoso Corte Real, da casa dos Srs. Cardosos Cortes
Reais, o qual foi presidente da relação do Porto e ainda
ministro; o morgado José Nunes Cardoso Corte Real, seu
irmão mais velho, que também era formado em direito.
Dois membros desta distinta
família, tios daqueles, foram frades; um, D. fr. Luís, foi
abade do Convento da Gralheira e o outro, fr. José, foi
domínico em Aveiro.
– A casa de Fundões, deu
também varões de grandes merecimentos:
Diogo Camossa,
o qual foi cônsul da Inglaterra em Aveiro; João Camossa,
que foi um dos maiores proprietários dos arredores; e ainda os
Drs. Manuel Camossa Nunes de Saldanha e João Baptista
Camossa Nunes de Saldanha, sobrinhos de João Camossa.
Da casa da Várzea,
salientaram-se João de Melo, formado em medicina pela
Universidade de Coimbra, e seus filhos formados em direito,
António da Silveira Toscano e João Toscano.
– Da casa do Roupal,
salientou-se um seu distinto membro, o doutor em direito José
Joaquim Correia de Magalhães.
Foi um juiz distinto,
principalmente orfanologista, e doutor em direito e advogado dos
auditórios do Porto, o Dr. Manuel Maurício de Araújo; seu
sobrinho, o Dr. Manuel Maciel Leite de Araújo, foi grande
médico e cirurgião.
*
/ 16 /
E a verdade é que, correspondendo ao nível próspero da sua
população, nível esse directamente ligado à intensificação das
culturas agrícolas e ao desenvolvimento da indústria, germinou nos
habitantes de S. João da Madeira, como já frisamos, uma autêntica
escola de trabalho e consequentemente um forte espírito de
solidariedade, que muito benéfico foi na efectivação de
melhoramentos de grande utilidade para a freguesia, modificações tão
importantes que alteraram duma maneira quase radical a facies e o
panorama arquitectónico da povoação.
Assim é que a igreja de S. João da
Madeira, pequenina e primitiva, foi toda renovada na sua estrutura.
Esse templo tão antigo, que alguns longievos contemporâneos ainda
recordam, foi demolido em 1883
(10); tinha
apenas metade da capacidade presente, era extremamente baixo e fazia
frente para a banda contrária, isto é, para oeste.
Logo no ano seguinte, em 1884,
iniciou-se a construção da igreja nova.
A 11 de Julho de 1886 era benzida e
inaugurada pelo pároco José Maria Henriques Tavares, todavia ainda
incompleta nos seus interiores e apenas com um altar concluído, o
altar da Senhora da Boa-Morte, onde se celebrou a primeira missa.
Posteriormente, por benemerências
especiais, a igreja foi-se completando e embelezando, tornando-se
uma das melhores do concelho de Oliveira de Azeméis.
O alargamento do adro, como a grande
escadaria de acesso, bem assim a cercadura de todo o adro com grades
de ferro foram mandados executar pelo benemérito Visconde de S. João
da Madeira e seu genro António Dias Garcia, conforme reza uma
lápide, patenteando a gratidão da Junta de Paróquia, em 1902.
Novas estradas se rasgaram e novos
empreendimentos se realizaram.
Ao dealbar do século importante
evento se efectivou: – S. João da Madeira era engrandecida com a
Linha de Caminho de Ferro do Vale do Vouga, que já havia sido
projectada em 1889.
O seu contrato definitivo foi
assinado em Janeiro de 1907; em Dezembro desse mesmo ano
iniciaram-se os trabalhos. El-Rei D. Manuel II, na companhia de
alguns ministros, inaugurou o troço dessa linha, desde Espinho a
Oliveira de Azeméis, em Novembro de 1908.
Esse precioso meio de comunicação
constituiu grande benefício para a nossa terra e ele mesmo
condicionou o grande desenvolvimento que tomou a indústria e o
comércio.
E outra obra se idealizou, outra
obra se vai tornar palpável; obra de carácter filantrópico,
verdadeiro monumento humanitário e germe de toda a assistência
social a empreender em S. João da Madeira: – Um Hospital.
Recordemos em poucos palavras a
figura do seu fundador, um dos maiores beneméritos da nossa terra: –
Francisco José Luís Ribeiro, nascido a 17 de Março de 1884,
na casa da Estrada.
Novo, embarcou para o Brasil e aí se
dedicou ao comércio; anos passados, foi para a Argentina, onde se
estabeleceu, na cidade de Rosário de Santa Fé; alcançou grande
prestígio e foi nomeado representante consular de Portugal.
Em 1910, regressou a Portugal.
Faleceu a 20 de Outubro de 1913.
Tudo o que ganhou legou para a
construção dum hospital, o hospital de S. João da Madeira.
Uma comissão organizadora
encarregada da administração do legado e da construção do hospital
ficou constituída pelo Rev.º António Joaquim de Oliveira, Manuel da
Silva Correia e António José Pinto de Oliveira, comissão que actuou
desde 15 de Outubro de 1914.
Por alturas de Maio de 1915 foi
traçada a sua planta; traçada por um técnico, Joaquim da Costa, de
linhas simples e amplas, o seu delineamento correspondia à
exigências científicas da época.
Acrescentemos que o edifício
hospitalar compreendia também duas galerias para convalescentes, de
10 metros cada, voltadas para nascente.
Estas galerias, todavia, nunca se
chegaram a construir.
Com a criação da Santa Casa da
Misericórdia e a eleição da primeira mesa que se formou para gerir a
irmandade, constituída por António José de Oliveira Júnior,
Durbalino Alves da Silva Laranjeira, Inocêncio Pereira Leal, Manuel
Luís da Costa, Quintino José da Silva, Genuíno José António da
Silva, Dr. Joaquim Alves Milheiro, José António das Neves e Manuel
Nicolau Soares da Costa (acto de posse em 28 de Maio de 1922),
deram-se os primeiros passos para a inauguração do hospital.
Esta efectuou-se no dia 1 de Janeiro
de 1923, tendo sido comemorada com uma sessão memorável em que
enalteceram a importância do acontecimento, todas as pessoas
categorizadas do nosso meio, tais como António José de Oliveira
Júnior, Dr. Amador Valente, Padre António Joaquim de Oliveira,
Quintino José da Silva, João Correia e Padre António Maria de
Almeida e Pinho.
Foi então posto em destaque, não só
o espírito filantrópico do fundador, Francisco José Luís Ribeiro,
mas também o concurso dos senhores Visconde de S. João da Madeira,
Comendador António Dias Garcia, Manuel Garcia, Manuel F. Dias
Garcia, Joaquim Garcia, José Rainho da Silva Carneiro, António Pinho
Neves, João Narciso da Silva e seus filhos, Dr. Renato Araújo,
/ 17 /
Dr. Artur Pinto Basto e Barão Tavares Leite, irmãos Correias, e
tantos outros beneméritos.
O pavilhão norte do corpo do
edifício hospitalar foi construído mais tarde por benemerência da
colónia sanjoanense do Brasil, e em especial, do Senhor Comendador
António Dias Garcia.
No mesmo ano, em 15 de Julho de
1923, coincidindo com as grandes festas da vila, outro importante
melhoramento foi inaugurado: – a luz eléctrica. Deve-se esse
benefício à iniciativa de Domingos José de Oliveira, José António
das Neves e António Joaquim Fernandes de Oliveira.
Com a criação em 12 de Abril de
1923, do Grupo Patriótico Sanjoanense, o qual teve como
presidente António Henriques, novo e extraordinário impulso
se deu ao progresso de S. João da Madeira.
A esse grupo de pioneiros bairristas
se deve um sem número de realizações: Avenida do Dr. Maciel, Avenida
de Dias Garcia, Avenida de Casadelo, Rua da Buciqueira, Rua de
Guerra Junqueiro, ampliação do Largo da Capela, Avenida Mousinho de
Albuquerque, projecto da construção do Teatro (cuja realização se
deve a Avelino da Silva Martins, em 1924), criação e apetrechamento
da Corporação de Bombeiros, projecto para novas instalações dos
Correios e Telégrafos, aquartelamento do posto da Guarda Nacional
Republicana na antiga residência paroquial, etc.
Foi também pela acção inteligente
desses sanjoanenses que a nossa terra obteve a categoria de vila.
O projecto de lei respectivo foi
apresentado no Senado da República, pelos senadores Drs. Pedro
Chaves e Ernesto de Castro, em Março de 1924.
Essa grande aspiração dos
sanjoanenses foi sancionada pela Lei n.º 1617, que o Diário do
Governo, de 6 de Julho desse mesmo ano inseriu.
Como se depreende, a satisfação
desta aspiração dos sanjoanenses foi um extraordinário incentivo, um
passo grande dado no sentido da autonomia, da emancipação completa e
criação do concelho de S. João da Madeira.
A verdade é que a Nossa Terra, em
múltiplas circunstâncias e por diversos motivos, não houvera sido
devidamente atendida nas suas pretensões pela Câmara de Oliveira de
Azeméis, como era jus.
A sua ânsia de progresso havia
sempre de embater com dificuldades de toda a ordem.
A propósito de certos actos lesivos
para os nossos interesses, um brado uníssono de todos os
sanjoanenses se levantava em cada uma dessas ocasiões.
Tal sucedeu aquando do pedido para a
reparação na Avenida Velha da Estação do C. F., na altura em que a
Câmara de Oliveira de Azeméis, em 1924, resolveu contrair um
empréstimo de 400 contos para permitir a instalação de luz eléctrica
na sede do concelho, no momento em que Macieira de Cambra, com o
apoio dos Sanjoanenses, pretendia ver concluída a estrada n.º 42,
aquando da criação do lugar de notário da vila, etc., etc.
A luta das aspirações bairristas de
S. João da Madeira, com a toada de obstrucionismo dos influentes de
Oliveira de Azeméis, havia de conduzir à satisfação integral das
nossas reivindicações.
Nessa luta teve um papel relevante,
outro elemento altamente construtivo, elemento que determinou e
regeu o destino de S. João da Madeira, nos nossos dias: – «O
Regional» (11), órgão da imprensa local
que começou a publicar-se no dia 1 de Janeiro de 1922, como
quinzenário.
Queremos destacar a sua comissão
fundadora, pois bem merece a memória de todos sanjoanenses.
Foi ela: António de Lima Correia,
Serafim Ferreira dos Santos, Manuel Luís Leite Júnior, João da Silva
Correia, João de Oliveira Ramos, Ramiro Martins Leão, Cirilo de
Azevedo, José Augusto Costa, José da Silva Correia, «grupo de
rapazes com o sangue a estuar nas veias e ansiosos do progresso
constante de S. João da Madeira», consoante afirmam e fazem
sublime propósito ao definirem o lema de «O Regional».
É através dele, de há 18 anos para
cá, que podemos seguir, a par e passo, toda a vida de S. João da
Madeira nos nossos dias, toda a nossa pugna pelo progresso material
pelas aspirações sanjoanenses, em suma, pelos legítimos interesses
da nossa terra, tomando-a cada vez maior, emancipando-a e dando-lhe
a projecção a que tinha merecidamente jus.
Ali se vê tornar grande, ali se vê
germinar a vida e a alma desta pequenina «Manchester».
Para se avaliar da sua importância,
prestemos atenção ao espírito de reacção de que atrás falamos,
prelúdio de emancipação que já se adivinha em artigos publicados no
começo da vida de «O Regional».
Assim, em Julho de 1922 (no período
anterior à instalação da luz eléctrica), a propósito da falta de
iluminação pública, pois que, tendo sido dotada por beneméritos
seus, duma instalação completa de candeeiros, já em 1910, foi aquela
suprimida em virtude da verba destinada pela Câmara de Oliveira de
Azeméis não chegar para tal serviço.
E, prontamente, o brado dos
sanjoanenses... (12) «Mas não têm talvez
aumentado as contribuições, não arrecada nesta freguesia a Câmara
impostos mais que suficientes para prover a esta despesa? Para que
servem as contribuições que desta terra anualmente saem sem nada
vermos que nos compense, sem nada se produzir que leve S. João da
Madeira a um progresso maior? Não queremos favores, não precisamos
de bajular seja quem for. Não pedimos como mendigos, falamos como
quem reclama um direito. Queremos só Justiça! Justiça!
/ 18 /
Justiça! Basta de apatia, basta de indolência!
Exigimos os nossos direitos, reclamamos aquilo que nos pertence.
...S. João da Madeira tem direitos
adquiridos porque é de todas as freguesias a que mais impostos paga
e a que mais contribui para o progresso e engrandecimento do
Município. Como está é que não pode ser! «Não há-de ser»!
A emancipação concelhia
O entusiasmo e a paixão pela
constituição do concelho de S. João da Madeira atingiram espontânea
e insensivelmente o apogeu e o verdadeiro fastígio da sua curva
evolutiva.
É necessário lembrarmos as
características psicológicas do sanjoanense e as suas determinantes
bio-temperamentais, porque isso nos ajuda a compreender a génese e a
execução de toda essa obra de engrandecimento e de autonomia.
Tão célere e grandiosa ascensão
revela sobremaneira quanto um povo se pode tornar grande pelo
trabalho e pelo amor ardente ao progresso.
Rememoremos aqui a feliz comparação
que fez um jornalista uma vez ao visitar a nossa terra: «Meses antes
do General Altamira, ditador do Chile, ser vencido pela
imposição do Presidente Alesandri – a polícia especialíssima
do Governo descobriu em Talvera, nas vizinhanças de Tacna,
um facto que alarmou os conservadores. A população de Talvera,
composta de 2 mil almas, implantara em segredo um regime social que
nenhum contacto ou semelhança apresentava com as instituições
vigentes. Abusava da ignorância corográfica do Ministério do
Interior – fizera-se esquecer por completo do Governo. Era um Estado
dentro de outro Estado. TaIvera vivia independente, próspera
e feliz. Governada pelos técnicos e pelos operários, eleitos em
proporções iguais, a sua indústria, a sua lavoura – e até as suas
artes atingiam uma riqueza e uma perfeição inverosímeis. Todos
viviam em paz. Todos se alimentavam bem, habitavam casas higiénicas,
e se divertiam. A sua biblioteca recebia todos os «vient-de
paraître»; e o seu teatro funcionava todas as noites. Uma guarnição
de 20 carabineiros, olvidada pelo Governo, constituía o seu
exército; as fronteiras, sem vigilância fiscal, com o Perú, eram o
único balcão do seu comércio – e o cárcere da terra era um edifício
perpetuamente desabitado».
A visão de S. João da Madeira
sugeria-lhe Talvera! E acrescentava, ainda, com vigor:
«S. João da Madeira devia ser
encaixilhado e exibido por todo o País, como um belo esboço
realizado – das mais belas utopias da sociologia moderna».
Um certo grau de atitude autista,
uma confiança ilimitada nas suas possibilidades, amor ao trabalho,
ao semelhante, à família e à colectividade, horror a tudo o que não
é vida e dinamismo, tais são as qualidades que, harmoniosamente
conjugadas, têm realizado a completa integração dos esforços de
todos os sanjoanenses, desde o mais humilde ao mais proeminente.
O entranhado bairrismo, a
solidariedade para a luta, firmada sempre entre todas as classes,
tal é o segredo bio-psíquico de que depende todo o sistema de
valorização material dos habitantes de S. João da Madeira.
O triunfo desta causa sagrada –
emancipação concelhia – verificou-se no momento em que todos os
sanjoanenses, solidariamente, manifestaram a necessidade de viverem
por si e para si, de lutarem mais ardentemente para a resolução dos
seus problemas e para satisfação dos seus interesses.
*
Por decreto de 11 de Outubro de
1926, foi criado o concelho de S. João da Madeira.
O decreto reza assim: «Considerando
que o desenvolvimento económico do país, base fundamental da sua
melhoria financeira, é resultante da actividade agrícola, industrial
e comercial dos vários agregados da sua população, cujo progresso,
por isso mesmo, ao Governo cumpre fomentar, por todos meios ao seu
alcance;
Considerando que a organização
administrativa de cada centro de população tem uma influência
importante na sua actividade, devendo estar de harmonia com a
categoria económica e social, sob pena de graves prejuízos para a
vida local;
Considerando que a vila e freguesia
de S. João da Madeira, do concelho de Oliveira de Azeméis, com as
suas numerosas fábricas e oficinas, que empregam alguns milhares de
operários, constitui hoje o centro industrial mais importante do
distrito de Aveiro e sustenta activas grandes transacções com o país
e as colónias, para o que dispõe de meios de comunicação, mantendo
também muito notáveis e benéficas instituições de carácter social,
criadas pela iniciativa particular;
Considerando que o desenvolvimento
económico e social de S. João da Madeira está sendo prejudicado,
sufocado, pela sua inferior categoria administrativa a qual não
permite a criação dos estabelecimentos de crédito indispensáveis ao
seu movimento industrial, à realização de medidas de carácter
higiénico e social em benefício da população, como o abastecimento e
canalização de águas, a construção de casas económicas
/ 19 /
para operários e o desenvolvimento de outras instituições já
existentes;
Considerando que só pela
independência municipal a vila de S. João da Madeira se colocará em
condições de, usufruindo as correspondentes regalias
administrativas, efectivar a resolução de necessidades urgentes e
cada vez maiores, quer de expansão industrial, quer de progresso
social;
Considerando além disso que a
separação da vila de S. João da Madeira nenhum prejuízo causa ao
concelho de Oliveira de Azeméis, que também constitui de per si um
núcleo forte de trabalho e conta vinte freguesias;
Em nome da Nação, o Governo da
República Portuguesa decreta, para valer como Iei, o seguinte:
Artigo 1.º – A freguesia de S. João
da Madeira, distrito de Aveiro, é desanexada do concelho de Oliveira
de Azeméis e constitui um concelho de 3.ª ordem, com sede na vila do
mesmo nome.
Artigo 2.º – A área do concelho de
S. João da Madeira, criado pelo presente decreto, é a mesma da
actual freguesia e vila agora desanexada ao concelho de Oliveira de
Azeméis.
Artigo 3.º – Fica revogada, quanto
ao concelho de S. João da Madeira, a legislação em contrário,
relativa à criação de novos concelhos.
Determina-se portanto a todas as
autoridades a quem o conhecimento e execução do presente decreto com
força de lei pertencer o cumpram e façam cumprir e guardar tão
inteiramente como nele se contém.
Os ministros de todas as Repartições
o façam imprimir, publicar e correr. Dado nos Paços do Governo da
República, em 11 de Outubro de 1926. – António Óscar de Fragoso
Carmona – Manuel Rodrigues Júnior – João José Sinel de Cordes –
Jaime Afreixo – António Maria de Betencourt Rodrigues – Abílio
Augusto Valdez de Passos e Sousa – João Belo – Artur Ricardo Jorge –
Felisberto Alves Pedrosa.
*
Aos esforços do grande sanjoanense
Dr. Renato Araújo e dum grupo de pessoas influentes da nossa terra,
grupo esse constituído por Genuíno Silva, Dr. Joaquim Milheiro,
António Henriques, Manuel Costa, Inocêncio Leal, José Correia, Padre
Almeida e Pinho, Augusto Palmares, o qual foi junto do governo
corroborar o pedido daquele ilustre bairrista, se deve este grande
acto de justiça, por parte do Governo português.
No dia 20 do mesmo mês tomou posse a
comissão administrativa da Nova Câmara, a qual ficou constituída
pelos senhores Benjamim José de Araújo (presidente), António
Henriques e Manuel Luís da Costa (vogais efectivos), António
Madureira, José António das Neves e José Gomes de Pinho Júnior
(vogais substitutos).
A Junta de freguesia era assim
composta: Francisco Luís da Costa e Manuel Henriques Soares
(efectivos); Manuel da Silva Correia e Avelino Martins (suplentes).
_________________________________
NOTAS
(1)
– «Portugaliae Monumenta Historica» – «Diplomata et Chartae» –
Volumen I págs. 421.
(2)
– «O Regional», n. º 369, 370, 372, 373, 374 e 375, de 23 de
Fevereiro de 1936 a 17 de Maio do mesmo ano.
(3)
– Estes documentos mereceram também a análise cuidadosa, em 1922, do
Dr. Aguiar Cardoso, em artigo publicado em «O Regional» de 18
de Junho, desse mesmo ano.
(4)
– Deve tratar-se do lugarejo de Santo Estêvão, lugar onde existe uma
mamôa, ou seja uma simples elevação de terreno, geralmente cobrindo
monumentos pré-históricos chamados Dólmens ou outros, mamôa essa que
constitui a ponta norte do monte «Castro Recharei», que se estende
para sul até S. Martinho da Gandra; é na parte média do monte, que
assenta o histórico Mosteiro de Cucujães, nos nossos dias adaptado a
Colégio de Missões.
(5)
– Documento transcrito integralmente pelo Rev. João Domingues Arêde,
erudito investigador, cujos trabalhos sobre o passado de Cucujães
são valiosíssimos. In «Cucujães e mosteiro com seu Couto, nos
tempos Medievais e Modernos», 1922, págs. 16.
(6)
– Torre do Tombo – Forais Antigos – Maço 8.º, n.º 1.
(7) –
«Inquir. del Rey dom Denis».
(8)
– Segundo Fortunato de Almeida, in Hist. Igr. Portug., tomo
lI, a libra (moeda de conta), no tempo de EI-rei D. Diniz, equivalia
acerca de 1$550 da moeda de 1911, o que corresponde aproximadamente
a 3$40 da moeda dos nossos dias.
(9)
– Extraído do livro «Portugal», «Dicionário Histórico,
Biographico, Heráldico, Chorographico, Numismático e Artístico»,
por Esteves Pereira e Guilherme Rodrigues, 1905.
(10)
– Na verdade, já em pleno século XVIII, por alturas de 1774, a nossa
igreja velhinha andava necessitada de grandes reparações. O facto é
que eram bem minguados os proventos da nossa terra para custear
despesas de tal importância. Um grupo de pessoas mais gradas de S.
João da Madeira fez uma representação junto de Sua Majestade EI-rei
e solicitaram dele a graça de um «real» por cada «quartilho» de
vinho e por cada arrátel de carne que se vendesse, na própria
freguesia de S. João da Madeira e de outras limítrofes. O caso é que
EI-rei, após informação desfavorável da Câmara da Feira, não
concedeu a «provisão» necessária para a citada graça do então
chamado «real dagua». Na própria sede da Comarca, na Feira, aos 30
dias do mês de Julho de 1774, houve reunião da «nobreza» e do
«povo», para se examinar novamente esta questão. Foi negada
informação favorável ao pedido da freguesia de S. João da Madeira,
em virtude das demais freguesias do concelho da Feira já se
encontrarem sobrecarregadas com a sobretaxa de «três reais» em cada
quartilho de vinho e em cada arrátel de carne. Um deles destinava-se
a custear a reparação das calçadas da vila. No entanto, conseguiu-se
nessa mesma altura que concedessem essa graça, apenas limitada aos
moradores de S. João da Madeira e às freguesias de Nogueira do Cravo
e Carregosa. A antiga igreja era constituída, além do corpo central,
por uma capela chamada do Senhor dos Passos e que se destacava do
lado sul desse
/ 20 / corpo, esta capela comunicava
com uma sacristia. Além desta sacristia, situada do lado sul, havia
ainda mais duas, uma voltada para o norte e outra também para o sul,
em situações correspondentes às duas que existem actualmente. Por
cima da sacristia do clero, havia uma sala onde se efectuavam as
reuniões das confrarias e ainda onde se guardavam as alfaias e
objectos do culto. A igreja tinha vários altares. O altar do Senhor
dos Passos estava situado na capela lateral do mesmo nome; a imagem
que a ele pertencia foi abandonada, após a demolição de 1883. O
altar do Senhor Crucificado estava situado do lado norte do corpo
central; a sua imagem está hoje no altar do Coração de Jesus, tendo
sido transformada no Senhor Morto. A cruz à qual esta imagem estava
pregada ainda hoje se aprecia na sacristia situada no lado norte por
debaixo da Sanefa que ali existe. O altar da Senhora da Boa-Morte
ficava do lado sul; a sua imagem ainda hoje se admira no altar do
Coração de Maria. Os dois altares que em último lugar citamos, o do
Senhor Crucificado e o da Senhora da Boa-Morte, foram vendidos para
a cidade do Porto, ainda que de valor riquíssimo, pois a sua talha
era de real significado artístico.
O produto da sua venda reverteu a
favor da construção da igreja actual, não sem provocar da parte dos
crentes uma certa indignação devido ao acrisolado amor e veneração
que tinha pelos citados altares Além das primeiras imagens, outras
mais passaram para igreja nova e ainda hoje as podemos ver. São
elas: a de S. João Baptista, do Mártir S. Sebastião, de Sant’Ana, da
Senhora do Rosário, de S. José, S. Bento, S. Gonçalo, S. Braz,
Senhora do Desterro, de S. Torcato e do Menino Jesus. Diz-nos mais o
Rev. Almeida e Pinho que «entre as imagens de santos que a velha
igreja nos legou existe ainda uma pequena imagem do Mártir S.
Sebastião, muito imperfeita e truncada, feita de gesso ou matéria
parecida, a qual foi encontrada dentro duma pia de pedra debaixo da
soleira da porta principal da igreja velha, aquando da sua
demolição».
Outras peças e objectos de culto
passaram e ainda hoje existem na nossa igreja provenientes da velha;
assim, a tribuna do Altar-Mor que teve de ser aumentada ainda que
insuficientemente, a pia baptismal modificada no seu aspecto
exterior, a antiquíssima cadeira paroquial, a grade que serve de
«mesa de comunhão», o relógio da torre tão primitivo e que foi
substituído, no ano de 1943, aquando de novos melhoramentos da
iniciativa do actual pároco, os três sinos (sino grande, meão e
pequeno).
(11)
– Neste momento queremos lembrar também outra publicação local, a
qual se pode considerar precursora de «O Regional». É ela a «Defesa
Local», quinzenário que apareceu em 31 de Janeiro de 1915 e saiu
com regularidade até 6 de Fevereiro de 1916. Era seu director
Domingos Oliveira, editor M. Lopes Simões, administrador, Quintans
Braga e M. Caseiro.
(12)
– Em «O Regional», de 30 de Julho de 1922. |