Domingo de Páscoa
1ª leitura: Actos, 10,
34-43
2ª leitura: Carta de S.
Paulo aos Colossenses, 3, 1-4 ou 1 Coríntios, 5, 6-8
Evangelho: S. João, 20,
1-9
Ao chegar uma antiga
diligência, o «ar» de quem vinha lá dentro podia dizer muito sobre
quem era tal gente…
Os
passos excitados das «visitas pascais» (ou «compasso»), pelas ruas
ou pelos montes, parecem anunciar: vem aí gente nova – e tem bom ar!
Mas
uma aragem inquietante. Já os evangelhos falam de gente apressada,
de perguntas, de contradições, de medos, de experiências estranhas,
de suspiros de alívio…
E a
personagem principal deixa-nos de olhos esbugalhados: rodeado
triunfalmente por uma guirlanda de rendas e flores… mostra-se Jesus
crucificado!
É bem
o símbolo da condição humana: a vida é mistura de prazer e dor. Mas
agora, surge uma promessa cheia de optimismo: na linha do mais
profundo desejo do ser humano, a «vida imperfeita» desabrocha em
«vida perfeita», pondo a render o próprio sofrimento e morte. Uma
aragem de novo mundo, que traz seiva nova às nossas alegrias, que
nas próprias tristezas se vão enroscar e crescer e florir.
Mas
não andarão «os crentes» a fugir deste mundo, onde queremos (e
devemos) gozar o nosso modo de existir? Não andarão a querer
persuadir-se de que a morte é apenas uma «peripécia» da vida?
A
aragem diz-nos que Jesus não foi aniquilado pela morte. E diz-nos
que homens e mulheres normais fizeram a experiência da «nova aragem»
(a «ressurreição» de Jesus não pode ser comprovada historicamente,
mas já se pode comprovar a seriedade intrínseca destas experiências,
pelos tempos fora).
A
«carruagem» continua a inquietar os seres humanos, até porque muita
gente ignorante ou comodista não aprova novas maneiras de ver a
realidade e de viver.
Se
temos fé em alguém, é porque apreendemos que essa confiança não só é
razoável como sobretudo dá sentido à vida (por isso diz S. Paulo:
«se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé», 1 Coríntios, 15, 17).
Ao fazer-nos bem, ao contribuir activamente para a felicidade no
mundo, a fé religiosa mostra o dinamismo que possui.
Em vez
do ar pesado de condenados à morte, ganhamos uma aragem que
harmoniza Deus e a humanidade. Deus deixa de ser «estraga-vidas»,
empecilho para a inteligência e afectividade, para ser o «duplo» nas
nossas aventuras.
O
discurso de Pedro anuncia esta experiência de integridade do ser
humano, em que se afirma o valor da vida de cada qual. A consciência
das falhas («pecados») torna-nos capazes de reconhecer perante os
outros o mau procedimento e que estamos dispostos a ter cada vez
mais «bom senso» (e por isso, todos têm que ser capazes de perdoar
«até 70x7» – ou seja, sem traçar limites mas também sem fazer vista
grossa ao que está mal feito).
É
claro, não falta quem use perfumes inebriantes para enganar os
curiosos. «Pelos frutos os conhecereis», alerta Jesus.
Mas Jesus não deu um
código de leis para o que é permitido ou proibido. Tinha tanta fé na
Humanidade, que apenas quis libertar o desejo universal de ser feliz
– que só é bem sucedido se fazemos os outros felizes.
E que o presente
só é cabalmente vivido se nos lançamos para o futuro, um futuro que
estará sempre à nossa frente.
Por
isso, a Páscoa é sempre um dia bonito. Em que acompanhamos a cruz
engalanada, respirando vida, amizade, saudade e alegria. |