Liturgia Pagã

 

«Eu sou o bom empresário»

4º Domingo de Páscoa (ano B)

1ª leitura: Actos dos Apóstolos, 4, 8-12

2ª leitura: 1ª Carta de S. João, 3, 1-2

Evangelho: S. João, 10, 11-18

 

Ao falar da sua missão, Jesus gostava de contar histórias de pastores. Hoje em dia, contaria histórias de empresários – e andou por lá perto, ao falar de grandes proprietários preocupados com os trabalhadores, com a boa gestão ou com verem os créditos mal parados…

Na tradição religiosa dos Judeus, a imagem de pastor aplica-se frequentemente a Deus e ao rei messiânico ou ainda aos altos responsáveis político-religiosos de Israel. Uma profissão bem árdua, apenas suportável com muito “amor à camisola” (hoje parece que o «like» vai para o trocar de camisola…).

Também acontece haver pastores sem amor nem às ovelhas nem sequer ao cajado. Interessa-lhes sobretudo tirar proveito do instrumento de poder, não hesitando em matar ovelhas à cajadada…

Graças a Deus – justamente a esse Deus como Jesus no-lo apresenta – há também muita gente que se sente inteiramente paga por gastar a vida («dar a vida») a descobrir novos empreendimentos que nos encham as medidas. Porque «dar a vida» é não ser avarento da vida, colhendo a alegria e o prazer de ajudar os outros a viver melhor. (Não é este o papel fundamental da família, a primeira empresa?).

Nos dias de hoje, Jesus Cristo até que podia apresentar-se como um empresário de visão e empenhado em partilhar esse discernimento com toda a gente. Não foge quando chega a hora de investir nos projectos que interessam de facto ao bem-estar de todos, resultando na abundância do «pão nosso» para o corpo e para o espírito. E quando encontra empresários ou políticos invejosos, para quem só o lucro pessoal é que vale, destruindo até a vida dos outros, ele não recua. Aliás, a todos industria para que saibam passar por cima da crise: reflectindo no que deve ser feito, no que é possível fazer com os recursos disponíveis, sem esquecer o «sal» de todas as actividades humanas – uma relação pessoal não enganosa, séria e afável, dentro do ideal da justiça.

Atitudes como esta são frequentemente vistas com desdém. Compreende-se: para lutar pelo que vale mais a pena é preciso ser uma pessoa de coragem. Coragem, por exemplo, para implementar uma eficiente organização social: cada vez mais nos damos conta de que os talentos de cada qual não são “investidos no melhor banco”. Há sempre falta de médicos capazes de «dar a vida» pela saúde de todos; de varredores de rua a «dar a vida» pela higiene e beleza das paisagens urbanas e rurais; de professores a «darem a vida» pelo futuro cultural das gerações humanas; de construtores a «dar a vida» pela segurança e harmonia das empreitadas; de políticos a «dar a vida» pela verdade e pelo bem comum… E a lista não tem fim, pois inclui o jeito de cada pessoa…

Só estes é que não são mercenários. Mercenário define-se como aquele que trabalha por interesse, a troco de dinheiro, e cedo começou a designar o que é movido apenas “por dinheiro”, mesmo na mais nobre das actividades.

Com «o melhor dos empresários», aprendemos que «dar a vida» é de facto o mais produtivo “investimento” numa vida que dá gosto viver. Até porque não somos «contratados» como «servos» mas convidados como «amigos» (João,15,15-17). Uma empresa onde não há lugar para o medo, mas sim para a esperança e audácia.

26-04-2015


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