Imaculada conceição de Nossa Senhora
1ª leitura: Génesis, 3, 9-15.20
2ª leitura: Efésios, 1, 3-6.11-12
Evangelho: S. Lucas, 1, 26-38
Que me lembre, este primeiro verso de uma
velha quadra tão «romântica» e tão verdadeira continua assim:
…«Se escreve a palavra “mãe”.
É das palavras pequenas
A maior que o mundo tem.»
Quando antigamente se celebrava neste dia «A festa da Mãe», ficava
um bocadinho intrigado: porquê nesta festa em vez da Natividade de
Nossa Senhora ou na Anunciação…?
Este recuar até ao tempo do amor que gerou a Mãe de Jesus tem, na
verdade, significados bem profundos: o principal será ver como, ao
longo da nossa história, a Humanidade se foi preparando para «dar a
volta» à «má gestão» da sua liberdade de escolha: a imprudente
ambição de Adão e Eva que, na portentosa lenda das nossas origens, é
punida com o sofrimento e morte, parecendo aniquilar os mais
profundos desejos da Humanidade. A cena expressiva do diálogo com a
serpente descreve as dúvidas e interrogações próprias da espécie
humana.
A serpente, pela aparência e sorrateiro rastejar, tornou-se um
símbolo do mal que espreita todos os seres humanos. Mas estes
levarão a melhor sobre «o animal mais astuto» e perigoso (o povo
hebraico tinha sobejas razões para a temer, quer no deserto quer nos
campos agrícolas). E assim como lhe conseguem esmagar a cabeça,
também saberão resistir ao mal e até esmagá-lo.
Na narrativa das origens, a mulher acaba por ser a protagonista. E
acaba por se tornar o símbolo da vida – o radical do nome «Eva»
significa «vida».
A figura de mãe e mulher é central em todas as produções artísticas.
Ainda hoje lembramos (em romances, filmes…) os cavaleiros de outros
tempos que lutavam e até davam a vida para defender «a honra da sua
dama». A mulher tinha que ser «ideal», sem defeitos. Por isso é
ainda normal que não se aceite ouvir falar mal da nossa mulher e
mãe.
Vastas comunidades cristãs, ao longo dos tempos, têm olhado para a
Mãe de Jesus como a mais ideal entre todas as mulheres. Esta Mulher
Mãe não podia ter «a mancha» da fragilidade característica dos
«descendentes de Eva». Quando o anjo lhe anunciou que iria ser Mãe
de Jesus, afirmou a sua concordância com o plano de Deus, a
Sabedoria absoluta, que não se pode colher como um fruto da árvore.
Fez assim o contraponto com Eva que se deixou levar pela serpente,
achando que de facto o plano de Deus não era justo, uma vez que os
seres humanos «não podiam ser como deuses». Nascia a ideia de uma «conceição
(concepção) imaculada» para Nossa Senhora, como símbolo da
libertação dos aspectos negativos da condição humana.
O profeta Jeremias começa por falar assim da sua vocação (1,4-5): «O
Senhor disse-me: antes de eu te formar no seio de tua mãe, antes de
saíres do ventre dela, eu já te conhecia». Se a vocação de Maria era
ser o berço fértil de Jesus, era natural que a tradição cristã
defendesse que esse próprio «berço» fora concebido sem defeito
algum.
De facto, Jesus Cristo marcou o ponto mais alto da união da
Humanidade com Deus. Ao ser ressuscitado – «exaltado por Deus com um
nome acima de todo o nome» – mostrou que a vida com Deus é vida sem
sofrimento e morte – é o verdadeiro regresso ao Paraíso.
Todos os bebés despertam afecto, com o encanto da sua fragilidade e
porque simbolizam a esperança de melhores tempos. A Mãe de Jesus
teve a sabedoria de reconhecer o anúncio da «salvação» – o mais
profundo desejo da Humanidade. Mas levou muitos anos (Lucas,2,41-51)
a dar-se conta de quanto custava ser mãe de Jesus – «com três
letrinhas apenas»…
08-12-2013 |