25º Domingo do tempo
comum (ano C)
1ª leitura: Profeta
Amós, 8, 4-7
2ª leitura: Carta de
S. Paulo a Timóteo, 2, 1-8
Evangelho: S. Lucas,
16, 1-13
Desde há milénios que a sociedade humana faz exercícios de
convivência com a injustiça. Promulgam-se leis sobre leis, mas todas
elas são fonte de novos falseamentos e acabam por acarretar uma
profunda falta de respeito por tudo o que seja lei.
Jesus e os seus seguidores preocuparam-se muito com esta questão, na
linha dos principais autores do Antigo Testamento. A 1ª leitura não
podia ser mais clara quanto à exploração infligida aos mais fracos
por parte dos mais poderosos – que até falseiam as balanças para
poderem fingir que são justos.
A lei é tanto mais necessária quanto menos dispostos estamos para
defender o que é bem. Por isso S. Paulo (carta aos Romanos, 7-8)
disse que a própria lei de Moisés acaba por ser sobretudo um «código
dos pecados». A abundância de leis afoga-nos de tal maneira, que nos
impede de ver o que é bom e o que é mau, e confunde o espírito das
pessoas honestas. Já no séc. XII, S. Bernardo escrevia: «se queres
ser obedecido, manda pouco».
Jesus e os profetas antigos diziam que a lei não vale nada sem «um
coração de carne» – um coração que ama e que portanto sabe agir com
eficiência e criatividade.
Não é verdade que hoje em dia preferimos esquecer a difícil mas
fundamental reflexão sobre o mal e o bem, para `descansar (tirando
proveito!) à sombra do que «está escrito»? Fugimos à
responsabilidade de pensar e de avaliar tanto a correcção dos nossos
actos como a forma mais adequada de enunciar os valores que promovem
a civilização.
É por isso que há cada vez mais formas sofisticadas até de matar –
aproveitando-se os buracos, omissões e ambiguidades da lei. Que
fazem aqueles que só pensam no (seu) crescimento económico,
esquecendo os milhões de pessoas que pagam com a vida o “sucesso
vil” desse programa? Desastres ecológicos, genocídios, terrorismo
violento... não interessam enquanto não os atingem directamente. E
por esses pobres e humildes espezinhados, quem fará três minutos de
silêncio?
No evangelho de hoje, um administrador falseou as contas. Para nosso
espanto, Jesus louvou-o. Não cumpriu as obrigações do contracto de
trabalho (embora retirando apenas os juros das dívidas ao
proprietário – velha questão social, presente em textos como Êxodo,
22, 24-26; Deuteronómio, 24,10-15; Neemias, 5), mas soube utilizar o
dinheiro para o melhor fim: ajudar os outros e solidificar relações
humanas capazes de aguentar as incertezas do futuro. Louvou-o também
porque foi exemplo de quem toma decisões prudentes num momento de
crise, e não se fica por aí a dizer mal da vida. E serviu-se também
desta parábola para apontar o dedo aos que se dizem dedicados ao
«reino de Deus», mas sem o entusiasmo e prudência dos que se dedicam
aos negócios deste mundo. Ora o «reino de Deus» precisa de gente que
saiba ver mais do que «um palmo à frente do nariz».
Várias vezes, os evangelistas relatam palavras e até acções de Jesus
que não jogam bem com os mais honestos conceitos de justiça.
Chamam-nos a uma visão mais abrangente e portanto mais realista do
que é a aventura humana; e fazem-nos ver que no «reino de Deus» não
há lugar para «ajustes de contas» – mesmo as que procuramos fazer
neste mundo dificilmente conseguem não ser estragadas pela
injustiça.
«O dinheiro é vil», quando nos leva a desprezar os outros – e isto é
que é desprezar Deus.
O dinheiro vale na medida em que o sabemos investir nas muitas e
muitas maneiras de assegurar o desenvolvimento global da
civilização.
Não é só condenável usar uma balança falsa: até uma balança exacta
pode ser usada com muita «malandrice», sempre que damos peso
desmedido ao interesse próprio.
Jesus põe-nos em guarda contra a tentação de falsear e contra a
fraqueza dos «pensamentos direitinhos», que não vêem um palmo à
frente do nariz, incapazes de criar mais trigo do que joio e de
sustentar as razões de esperança.
22-09-2013 |