Domingo V da Páscoa (ano C)
1ª leitura:
Actos dos
Apóstolos, 14, 21-27
2ª leitura:
Livro do
Apocalipse, 21, 1-5
Evangelho:
S. João,
13, 31-35
E um
novo céu, como diz o autor do Apocalipse – esse livro cheio de
imagens estranhas, grandiosas e também temerosas, e que leva muita
gente a julgar que são a «revelação» (ou «apocalipse») de
acontecimentos actuais e do futuro. Ora este último livro do Novo
Testamento apenas usa essas imagens para dar corpo a uma profunda
reflexão sobre o que é a vida humana, onde se sente tanta injustiça,
tanto sofrimento, mas também tanta bondade – e especialmente sobre o
sentido dessa vida.
A
consciência da nossa dor, dos nossos desejos e da nossa bondade
torna-nos mais sensíveis à realidade de Deus e de que o seu projecto
é a instauração de «um novo céu e uma nova terra», uma nova ordem do
universo, como já poetizara o 3º autor do Livro de Isaías
(65,17-25). «Desaparece o próprio mar» (2ª leitura), pois o mar
simboliza a violência, o caos, a origem dos grandes monstros
(Apoc.13,1-10). Doravante, os seres humanos não encontrarão lugar
para a maldade e tristeza, e cada qual pode seguir os impulsos do
coração e agir de um modo tão benéfico para todos que será patente
que «Deus habita com os homens». Enfim, a forma perfeita do «reino
de Deus», pela qual vale a pena «sofrer algumas tribulações», como
se lê nos Actos dos Apóstolos.
Se
não ouvirmos os mais profundos desejos, não podemos sonhar com um
clima de confiança entre os seres humanos, assente na vontade de
desmontar os caminhos da injustiça e de descobrir a harmonização
possível entre o que é bom para cada qual e para a comunidade em
conjunto.
Jesus
Cristo deixa-nos o segredo para esse «novo céu e nova terra». É bem
conhecido, mas a verdade é que passou a ser olhado apenas como
bonitinho e «beato» – até consta que os próprios discípulos de S.
João estavam fartos de o ouvir tantas vezes!
É
como que o «artigo único» de uma nova Constituição: querer o bem uns
dos outros. E como é que Jesus nos deu o exemplo de amar?
●
Pelos vistos, procurou trabalhar e ser bem aceite no seu meio (sendo
facilmente identificado como «o filho do carpinteiro»).
● Não
considerou a vida quotidiana como lixo, mas serviu-se dela para se
tornar adulto e solidificar a estrutura necessária para a missão a
que se sentia chamado (Lucas,2,52).
●
Reflectiu seriamente sobre a validade e solidez do seu projecto de
vida, atento ao que podia dar aos outros de melhor (Lucas,4,1-13,
Mateus,7,24-29).
●
Para realizar a sua missão, não hesitou, por vezes, em demarcar-se
de familiares, amigos e gente influente na sociedade; mas apontando
razões, sublinhando o sinal positivo das suas atitudes e
mostrando-se muito atento às potencialidades de cada qual (lembrar o
episódio da samaritana em João,4; da «pecadora» em Lucas,7,36-50; a
parábola dos «trabalhadores da vinha» em Mateus,20,1-16;…).
●
Preocupou-se com o bem-estar físico e espiritual das pessoas em
concreto (sobretudo das mais abandonadas socialmente).
●
Opôs-se às classe dirigentes políticas e religiosas (Mateus,23)
quando não defendem a dignidade da vida de cada ser humano e
dificultam o entusiasmo e as energias insubstituíveis de cada qual.
●
Aceitou e publicitou a morte como testemunho da vontade em querer
deixar aos outros alento para cultivarem a vida e a certeza de que o
desejo de sempre mais vida será plenamente satisfeito. Consciente de
que a sua posição firme em defesa do bem lhe trazia o risco de morte
violenta. Sem ter vergonha de chorar e de gritar a tristeza e dor,
sobretudo por se sentir sozinho. Mas tirando partido da força e
beleza da amizade.
O
«artigo único» é exigente, vai contra a tentação comodista de não
ter que reflectir sobre o que é que está bem ou está mal. E é a
única força que assegura a criação, desde já mas não ainda de forma
completa, de «um novo céu e uma nova terra».
28-04-2013 |