De:
Eduardo
Figueiredo
Data: 21/12/2006 01:48
Assunto: Humor negro bem real: uma análise ao sistema bancário
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Humor negro mas real: uma análise bem feita
ao sistema bancário. Esta carta foi direccionada ao Banco BES.
Todavia, devido à criatividade com que foi redigida, deveria ser
direccionada a todas as instituições financeiras.
CARTA ABERTA AO BES
Exmos Senhores Administradores do BES
Gostaria de saber se os senhores aceitariam pagar uma taxa, uma
pequena taxa mensal, pela existência da padaria na esquina da
vossa rua, ou pela existência do posto de gasolina ou da
farmácia ou da tabacaria, ou de qualquer outro desses serviços
indispensáveis ao nosso dia-a-dia. Funcionaria desta forma:
todos os meses, os senhores e todos os usuários pagariam uma
pequena taxa para a manutenção dos serviços (padaria, farmácia,
mecânico, tabacaria, frutaria, etc.). Uma taxa que não
garantiria nenhum direito extraordinário ao utilizador. Serviria
apenas para enriquecer os proprietários sob a alegação de servir
para manter um serviço de alta qualidade ou para amortizar
investimentos. Por qualquer produto adquirido (um pão, um
remédio, uns litros de combustível, etc.) o usuário pagaria os
preços de mercado ou, dependendo do produto, até ligeiramente
acima do preço de mercado. Que tal?
Pois ontem saí do meu BES com a certeza que os senhores
concordariam com tais taxas. Por uma questão de equidade e de
honestidade. A minha certeza deriva de um raciocínio simples,
que passo a expor.
Vamos imaginar a seguinte situação: eu vou à padaria para
comprar um pão. O padeiro atende-me muito gentilmente, vende o
pão e cobra-me o serviço de embrulhar ou ensacar o pão, assim
como todo e qualquer outro serviço. Além disso, impõe-me taxas.
Uma "taxa de acesso ao pão", outra "taxa por guardar pão quente"
e ainda uma "taxa de abertura da padaria". Tudo com muita
cordialidade e muito profissionalismo, claro!
Fazendo uma comparação com a qual talvez os padeiros não
concordem, foi o que ocorreu comigo no meu Banco. Financiei um
carro. Ou seja, comprei um produto do negócio bancário. Os
senhores cobraram-me os preços de mercado, tal como o padeiro me
cobra o preço de mercado pelo pão. Entretanto, de forma bem
diferente do padeiro, os senhores não se satisfazem cobrando-me
apenas o produto que adquiri. Para ter acesso ao produto do v/.
negócio, os senhores cobraram-me uma "taxa de abertura de
crédito"
–equivalente
àquela hipotética "taxa de acesso ao pão", que os senhores
certamente achariam um absurdo e se negariam a pagar.
Não satisfeitos, para ter acesso ao pão, digo, ao financiamento,
fui obrigado a abrir uma conta corrente no v/. Banco. Para que
isso fosse possível, os senhores cobraram-me uma "taxa de
abertura de conta". Como só é possível fazer negócios com
os senhores depois de abrir uma conta, essa "taxa de abertura de
conta" assemelhar-se-ia a uma "taxa de abertura da padaria",
pois só é possível fazer negócios com o padeiro depois de ele
abrir a padaria.
Antigamente, os empréstimos bancários eram popularmente
conhecidos como "Papagaios". Para gerir o "papagaio", alguns
gerentes sem escrúpulos cobravam "por fora" o que era devido.
Fiquei com a impressão que o Banco resolveu antecipar-se aos
gerentes sem escrúpulos. Agora, ao contrário de "por fora" temos
muitos "por dentro".
Pedi um extracto da minha conta
–
um único extracto por mês
–
e os senhores cobraram-me uma taxa de 1 EURO. Olhando para o
extracto, descobri uma outra taxa de 5 EUROS "para a manutenção
da conta"
–
semelhante àquela "taxa pela existência da padaria na esquina da
rua".
Mas a surpresa não se ficou por aqui: descobri outra taxa de 25
EUROS por cada cada trimestre
–
uma taxa para manter um limite especial que não me dá nenhum
direito. Se eu utilizar o limite especial vou pagar os juros
mais altos do mundo. Semelhante àquela "taxa por guardar o pão
quente".
Mas, os senhores são insaciáveis. A prestável funcionária que me
atendeu entregou-me um desdobrável onde sou informado que me
cobrarão taxas por todo e qualquer movimento que eu fizer.
Cordialmente, retribuindo tanta gentileza, gostaria de
alertar que os senhores se devem ter esquecido de cobrar o ar
que respirei enquanto estive nas instalações do v/. Banco.
Por favor, esclareçam-me uma dúvida: até agora não sei se
comprei um financiamento ou se vendi a alma. Depois de eu pagar
as taxas correspondentes, talvez os senhores me respondam
informando, muito cordial e profissionalmente, que um serviço
bancário é muito diferente de uma padaria. Que a v/.
responsabilidade é muito grande, que existem inúmeras exigências
legais, que os riscos do negócio são muito elevados, etc., etc.,
etc., e que apesar de lamentarem muito e nada poderem fazer,
tudo o que estão a cobrar está devidamente coberto por lei,
regulamentado e autorizado pelo Banco de Portugal.
Sei disso. Como sei, também, que existem seguros e garantias
legais que protegem o v/. negócio de todo e qualquer risco.
Presumo que os riscos de uma padaria, que não conta com o poder
de influência dos senhores, talvez sejam muito mais elevados.
Sei que são legais. Mas, também sei que são imorais. Por mais
que estejam protegidos pelas leis, tais taxas são uma
imoralidade. O cartel algum dia vai acabar e cá estaremos depois
para cobrar da mesma forma.
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