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            Constituiria grave injustiça esta 
            Revista ignorar um facto transcendente da vida nacional: o 
            passamento de Salazar. 
            Com efeito, a História deste País, 
            que contém em si mesmo os sinais mais contraditórios do génio e da 
            «apagada e vil tristeza», haverá de registar nos seus anais um 
            mandato de 40 anos, que se poderá discutir mas que não será legítimo 
            menosprezar e muito menos ignorar. 
            A perspectiva histórica fará esbater 
            sombras e avivar contornos ainda mal definidos, não obstante a má 
            memória dos homens, melhor, no entanto, que a das nações. 
            É que restarão sempre cidadãos 
            independentes, que nunca se deixaram atrelar ao carro do Poder para 
            melhor vencer na vida, eriçada de incompreensões, invejas, ódios, 
            paixões, fanatismos e tibiezas. 
            Muitos de nós seríamos tentados a 
            dizer que nem sempre estivemos de acordo com Salazar. 
            Isso, se determinado por honesto 
            sentido crítico, será uma manifestação de independência e de 
            liberdade, quer nos situemos no conceito de Stuart Mill, quer muito 
            simplesmente no de S. Pedro. 
            Mas se nos recolhermos à nossa 
            insignificância, não seremos obrigados a reconhecer, humildemente, 
            que nos falecem meios para apreciar e compreender, pelo menos 
            imediatamente, os nebulosos rasgos dum génio?
            
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            É que, em boa verdade, o génio ou se 
            aceita ou se repudia. 
            Está nisso uma atitude de confiança 
            ou de desconfiança, de fé ou de cepticismo no mandatário dos nossos 
            interesses. 
            Contestado ou aceite, vilipendiado 
            ou adulado, uma certeza transparece com nitidez na figura enorme de 
            Salazar: a sua honestidade, o seu desapego aos bens materiais, a sua 
            dedicação à causa da Pátria, que tomou como esposa, o seu fascínio 
            de autêntico condutor de homens, em resumo, o seu fulgurante génio 
            político. 
            Como sempre, muitos o idolatraram, 
            mas não tiveram categoria para seguir o seu trilho, outros o 
            contestaram e entretanto lhe copiaram os métodos. 
            Curvemo-nos, pois, ante a sua 
            veneranda memória. Como lapidarmente definiu Marcelo Caetano, o que 
            fica para a História é o saldo positivo da sua acção governativa. É 
            caso para dizer: Morreu o Génio! Viva o Génio. 
            FERNANDO DE 
            OLIVEIRA |