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                1.º - Nasci filho legítimo de 
                uma família da média burguesia e fui educado, com meus irmãos na 
                honra, na generosidade, no respeito pelos direitos e dignidade 
                do próximo e na ajuda e socorro dos mais humildes. 2.º - Meus Pais eram católicos e liberais – no perfeito sentido 
                da palavra – e assim nos educaram.
 3.º - Meus Pais eram democráticos e nunca compraram para um 
                filho um objecto que o não comprassem, também para os outros.
 4.º - Fui educado no respeito da verdade e da minha própria 
                pessoa e dignidade.
 5.º - Procurei sempre ser justo e generoso.
 6.º - Casei-me por amor na igreja de Sangalhos e assim nas 
                tradições de meus Pais e de minha Mulher, eduquei os meus três 
                filhos também.
 7.º - Meus filhos têm cursos superiores, assim como minha 
                Mulher.
 8.º - Dei a meus filhos o meu exemplo cívico e educação 
                religiosa e não me poupei a sacrifícios, apesar das minhas 
                dificuldades pois eles cursaram colégios qualificados e até 
                minha Filha foi aluna do colégio de freiras da Av. Manuel da 
                Maia.
 9.º - Tenho três netos, orientados como eu e os meus filhos o 
                foram exactamente, para que possam ser livres e conscientes.
 10.º - Obtive pelo meu trabalho alguns bens que juntei aos que 
                herdei de meus Pais e de meus Sogros, para suprir a eventual 
                miséria da falta de saúde. Porém
 11.º - Porque fui candidato à Presidência da República, sou 
                vítima de um insidioso, falso e malévolo processo, onde somente 
                ressalta o desejo da minha aniquilação.
 12.º - Tal processo não é o meu retrato, mas o retrato da PIDE.
 13.º - Esta pretende aniquilar-me, só porque participei numas 
                eleições e assim quer aniquilar qualquer oposição.
 14.º - Com o seu processo contra o signatário mostram o seu 
                inteiro desrespeito pela Lei e pela Justiça.
 15.º - Tais factos e a circunstância de termos chegado no nosso 
                País ao extremo limite de ver destruídos todos os direitos 
                cívicos fundamentais e até na profissão do signatário serem, 
                como a Polícia pretende, coarctados os direitos de livre 
                exercício, impuseram a actuação do homem e do advogado nessas 
                eleições.
 16.º - As alegações que pretendem a minha prisão mostram 
                claramente o arbítrio de que são passivos todos aqueles que não 
                aceitam o partido único, como solução nacional imposta.
 Por tudo, eu,
 17.º - Como um desses homens, mas criado e educado na fé da Lei 
                e da Justiça, da pureza e da independência delas, até ao fim dos 
                séculos,
 
 Espero a minha liberdade
 
                Cadeia de Caxias, Reduto 
                Norte, um de Fevereiro de 1962 (dois).
 O presidiário as. Arlindo Augusto Pires Vicente.
 
                («‘Conclusões’ da Carta ao Juiz Corregedor». 
                Autos de Segurança, processo n.º 16.068/62, do 1.º Juízo 
                Criminal de Lisboa, fls. 182 e 183). |