Este livro proporciona, a todos quantos o lerem, especialmente os
leitores mais ligados à nossa modalidade, momentos
de fruição, preenchidos com boas e várias recompensas.
O relato dos primeiros anos do Séc. XX oferece-nos uma “viagem” com
factos tão curiosos quanto surpreendentes. À medida que caminhamos
no tempo, aqueles que foram contemporâneos dos factos ou dos
acontecimentos relatados, terão a oportunidade de reviver esses
momentos da vida da nossa modalidade. Desenganem-se aqueles que
pensam, por causa do título do livro, que a informação que nos é
oferecida se queda pelo atletismo de Aveiro “tout court”. O
atletismo de Aveiro cresceu e desenvolveu-se sempre como parte
integrada no todo do atletismo nacional.
O livro “História do Atletismo Aveirense – (Século XX)”, abre uma
janela que nos possibilita ver de alto e com horizontes largos a
complexa conjugação de factores que nos transporta, paulatinamente,
de um estádio de desenvolvimento para outro mais evoluído. Permite
ver como a acção do Homem e das organizações por si tecidas,
transformam a realidade, tornando-a cada vez mais complexa e
exigente.
Uma coisa é analisar a história da nossa modalidade através das
listas de resultados, trabalho indispensável e meritório, outra,
muito diferente, com aplicação mais vasta, apela à reflexão sobre a
influência dos chamados factores de desenvolvimento.
Não menos relevante é perceber-se que as conquistas conseguidas com
muito esforço e persistência, são, todavia, muito perecíveis,
podendo perder-se em breves instantes. Crises, muitas vezes de
pequena monta, podem deitar a perder muitos anos de dedicação. O
exemplo da pista coberta de Aveiro ilustra cabalmente esta
afirmação. Todo o esforço, de anos, desenvolvido para a sua
instalação, caiu por terra com uma decisão de demolição, sem
qualquer desenho de alternativa.
O que somos hoje não resulta de factos isolados ou de esforços
individuais. O que somos, aquilo em que nos tornamos, é o resultado
do esforço continuado e de um forte compromisso, partilhado por
muitos e durante longos períodos de tempo. Os resultados, o seu
progresso ou o seu retrocesso, não acontecem espontaneamente.
Os resultados derivam da articulação, simultânea, de diferentes
factores, como por exemplo: Infra-estruturas Desportivas,
Apetrechamento, Enquadramento Humano (técnico e dirigente) e
respectiva Formação, Quadro Competitivo, Tecido Associativo
(clubes), Financiamento, Pensamento e Acção Estratégica,
Relacionamento Institucional.
Esta obra aborda os principais factos e acontecimentos do atletismo
aveirense, porém, o “escrevinhador”, como o próprio autor a si se
refere, não se fica por aí. Descreve as expectativas, as lutas, e,
sobretudo, a persistência resistente das gentes do atletismo
aveirense. Expectativas e lutas em demanda de um atletismo melhor,
praticado por muitos e com resultados cada vez melhores.
Pena é que no atletismo nacional não abundem mais contributos com
idêntico labor historiográfico. Muito ganharíamos com tal
empreendimento. Que alguém siga este exemplo e deite mãos à obra.
Aveiro cidade e o distrito de que é capital, mantém, desde o início
do Séc. XX, uma actividade muito relevante no atletismo nacional. Ao
longo de décadas o atletismo existiu e progrediu, quer no número de
praticantes, quer, mais especificamente, no número de talentos
oferecidos, sobretudo, aos grandes clubes da capital.
Apesar da manifesta falta de infra-estruturas para a modalidade, os
dirigentes associativos, bem assim como os dirigentes e treinadores
dos clubes, teimaram em não baixar os braços. Muita dessa história
de entrega abnegada à nossa causa comum, transparece da leitura
desta obra.
Deixei para o fim, algumas palavras, sempre insuficientes, acerca do
autor do livro.
Conheço, há alguns anos, o Eng. António Carretas. Quem com ele já
partilhou alguns, mesmo que escassos, momentos, percebe,
imediatamente, estar perante alguém cujos horizontes não se confinam
à visão e à postura do Homem comum.
Para além da sua vida profissional, ofereceu à nossa modalidade a
sua competência como dirigente e como juiz. Uma boa parte daquilo
que a Associação de Atletismo de Aveiro, ao longo de anos, ofereceu
à modalidade, deve-se ao seu labor e à sua liderança.
É também conhecida, não suficientemente, a sua face de cronista,
sobretudo no âmbito do género das crónicas de viagens. Porém, não se
fica pela palavra escrita. Acrescenta-lhe a imagem visual. Torna,
assim, ainda mais completas as suas mensagens e a sua interpretação
do mundo que o rodeia. Descreve, fotografa e pinta o quotidiano e,
não menos relevante, expõe o seu trabalho.
A imagem que o Eng. António Carretas reflecte não é a do
especialista das pequenas coisas mas sim a do humanista a quem todas
as causas, que ao Homem dizem respeito, interessam.
Ainda, e acima destas obras mais substantivas, não fosse ele químico
de formação, vejo nele um alquimista dos afectos. Nas relações
pessoais, nos textos que escreve, nas imagens que capta, nas
aguarelas ou acrílicos que pinta lá está o afecto como um “cimento”
que junta e agrega.
Como presidente da Federação Portuguesa de Atletismo manifesto o meu
orgulho por podermos contar com a sua participação nas nossas
causas. Muito teria o atletismo a ganhar com mais cidadãos desta
craveira. Também as nossas causas vão muito para além, mais do que
se julga, do simples correr, marchar, saltar ou lançar.
Agradeço-lhe, António Carretas, em nome do atletismo português, este
contributo para a história do nossa modalidade. Podemos, assim,
compreender um pouco mais do nosso passado e perspectivar melhor o
nosso futuro.
Bem haja.
Jorge
Vieira |